17/08/2018 às 09h14min - Atualizada em 17/08/2018 às 09h14min

Inconformado com sentença, advogado desacata juíza em apelação: ‘toupeira com cara de prego’



Após perder um processo por danos morais, um advogado de São Luiz do Paraitinga (SP) entrou uma apelação na Justiça em que fez uso de termos ofensivos contra a juíza que deu a sentença. Entre as palavras usadas no recurso com referência à magistrada estão ‘toupeira com cara de prego’, ‘demente’ e ‘imbecil’. O advogado nega que tenha tido o objetivo de ofender a juíza e considera ter feito uso de ‘licença poética’ (leia mais abaixo). A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) informou que abriu um processo disciplinar contra o profissional.

O advogado Matheus Monteiro de Barros Ferreira, de 30 anos, entrou com uma ação em causa prória em novembro de 2017, depois de uma desavença nas redes sociais. Nela, ele diz ter sido chamado de ‘desonesto’, ‘safado’, ‘ignorante’, ‘dissimulado’, ‘pedaço de merda’, ‘hipócrita’ e ‘pombo jogando xadrez’. Ele pediu ao réu indenização por danos morais no valor de R$ 4 mil.

A juíza Ana Letícia de Oliveira dos Santos entendeu que o autor da ação e o réu se provocaram, com ofensas mútuas. “Não se identificou elementos que possam fazer presumir que os insultos externados passaram da esfera do mero aborrecimento cotidiano”, disse a juíza na decisão.

Para tentar reverter a sentença, o advogado entrou com uma apelação, no último dia 31, em que afirma que queria demonstrar, na prática, como era ser ofendido. Ele destacou no documento que não tinha a intenção de ofender, embora tenha feito referência direta à magistrada.

Para argumentar, Matheus usa termos ofensivos contra a magistrada, segundo ele, para exemplificar a situação. “Essa ’p* ignorante’, que está no cargo de juíza da Comarca São Luiz do Paraitinga, alega simplesmente o oposto, sem qualquer fundamento a priori, tirando do próprio rabo entendimento antijurídico dissonante”, disse em trecho.

“Como se não bastasse, essa ‘retard*’ julgou o processo de forma antecipada, com improcedência total, alegando falta de prova da ofensa à honra subjetiva, sendo que esta mesma imbecil argumenta, no início da sentença, que sendo necessária qualquer produção de prova, a audiência de instrução é indispensável”, disse em outro trecho.

No decorrer do documento, ele ainda usa palavras como ‘burra’, ‘babaca’ e ‘avoada’ contra a juíza.

Ela foi procurada pelo G1, mas não pode dar entrevista por causa da lei da magistratura, que veta entrevistas sobre os processos. O Tribunal de Justiça informou que o advogado foi afastado das atividades por 90 dias e que os termos usados por ele fogem aos parâmetros da ‘razoabilidade’ e do respeito pertinente às peças jurídicas.

A ação movida por Matheus ainda tramita na Justiça em São Luiz do Paraitinga, onde aguarda prazo para manifestação do réu. Não há data para decisão sobre o mérito da apelação.

Advogado considera ter um estilo de trabalho ofensivo, mas nega que tenha tido intenção de ofender (Foto: Reprodução)

Advogado considera ter um estilo de trabalho ofensivo, mas nega que tenha tido intenção de ofender (Foto: Reprodução)


Advogado avalia que condução do processo tem erros técnicos (Foto: Reprodução)

Advogado avalia que condução do processo tem erros técnicos (Foto: Reprodução)


Outro lado

Por telefone, o advogado Matheus informou ao G1 que não teve a intenção de ofender a juíza e que deixou claro na apelação que as palavras foram usadas como uma demonstração de como é ser ofendido. Ele, que atua há quatro anos como advogado, ainda apontou o que considera que houve erro técnico na condução do processo pela magistrada.

“Não considero que ofendi a juíza porque na petição eu deixei claro, por escrito, que não queria ofendê-la. Foi uma ‘licença poética’, usei de figura de linguagem para exagerar, mostrar que a idéia dela na decisão, oposta ao que eu considero correto, era ridícula”, afirmou

“Caso ela tenha se sentido ofendida, isso só prova que eu estou certo, que no mundo real não funciona assim, de sair ofendendo as pessoas sem que nada aconteça. Se a ofensa, em hipótese, não tivesse sido contra a juíza, então não teria problema? Eu acho que o problema é quem se sente ofendido e não o que é dito na ofensa. Por isso eu quis que a juíza percebesse esses dois universos: dos juizes, a quem nada pode ser dito, sendo como ‘deuses’; e o das pessoas comuns”, completou.


Ele avalia também que a sentença foi injusta porque a juíza não tinha elementos para o julgamento. “Houve um juri antecipado, não houve audiência para que eu pudesse ser ouvido”, disse.

O profissional reconheceu que teve uma postura ofensiva, mas não está arrependido. “Ofensivo não é o mesmo que agressivo. Nos meus processos eu tenho esse estilo de ‘falar mesmo’, de escrever de forma direta o que eu quero sustentar”, avaliou.
O advogado disse também que não escreveu a petição instantâneamente, que agiu de maneira premeditada. “Eu li, achei absurdo e, por três semanas elaborei uma resposta de maneira racional. Minha categoria, no que tenho visto, concorda com a minha ação”, concluiu.

Advogado de São Luiz do Paraitinga ofendeu juíza em texto de apelação (Foto: Reprodução)

Advogado de São Luiz do Paraitinga ofendeu juíza em texto de apelação (Foto: Reprodução)


OAB

O presidente da OAB de São Luiz do Paraitinga, Laércio Sant´Ana Silva informou que um processo disciplinar foi aberto contra o advogado Matheus Ferreira no Tribunal de Ética e Disciplina Regional da Ordem, em São José dos Campos. Se a condiuta dele for julgada irregular, o advogado pode ser punido com a perda da carteira da ordem e consequente impedimento de exercício da profissão.

Ele disse ainda que a OAB repudia a ação do advogado que ofendeu a juíza na apelação. “Sou advogado há mais de 20 anos e nunca vi nada assim. Os termos usados são ofensivos, desagradáveis, além da questão de ser crime contra a mulher”, sustentou Sant´Anna.

A entidade também emitiu uma nota de repúdio contra o comportamento de Matheus. “A imunidade profissional conferida ao advogado não é absoluta e deve resguardar limites estabelecidos não só pelas normas legais, mas principalmente pela mínima educação necessária a todos.

[…[ A advocacia luizense não compactua com situações como esta e se solidariza à magistrada”, diz o documento da OAB. Redação com G1

Link
Tags »
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Primeiras Notícias Publicidade 1200x90