18/04/2018 às 14h18min - Atualizada em 18/04/2018 às 14h18min

Tenente-coronel é afastado após denúncia de assédio contra PM que se matou

Metrópoles
O tenente-coronel Márcio Barbosa da Silva é alvo de investigação do MP e da Corregedoria da PMDF
O tenente-coronel Márcio Barbosa da Silva, da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), foi afastado provisoriamente das funções devido a uma investigação sobre possível indução ao suicídio de uma subordinada. O caso passou a ser investigado pela Promotoria de Justiça Militar do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e Corregedoria da corporação, após a morte de uma tenente em 22 de março, no Guará II.

De acordo com PMs ouvidos pelo Metrópoles, a tenente que tirou a própria vida não foi a única militar alvo de assédio moral por parte do superior. Mais três oficiais que eram subordinadas a Silva foram afastadas recentemente devido a problemas psicológicos. A reportagem preservou os nomes e os detalhes dos casos, em respeito às vítimas e aos parentes.

Outras denúncias foram enviadas à promotoria e estão em fase de apuração. O tenente-coronel era subcomandante administrativo nas regiões do Guará, Estrutural, Lago Sul e Setor de Indústria e Abastecimento (SIA).

O afastamento se deu a pedido do encarregado do Inquérito Policial Militar (IPM), que tramita no Departamento de Controle e Correição. Além disso, conforme apuração da reportagem, o oficial teve o porte de arma suspenso, o passaporte recolhido e está proibido de assumir função de comando.

Por meio de nota, a PMDF confirmou a decisão e ressaltou que afastar chefes em casos de suicídios de subordinados trata-se de procedimento “rotineiro”.

O referido oficial não está preso, ele foi afastado provisoriamente das funções, enquanto perdurarem as investigações. A instituição não poderá se manifestar com mais detalhes, para preservar o sigilo das apurações"

Trecho de nota da PMDF

O MPDFT também confirmou que há uma investigação em curso. Porém, segundo explicou, o procedimento é sigiloso, por isso não é possível divulgar detalhes da diligência. A reportagem não conseguiu contato com a defesa do tenente-coronel Márcio Barbosa da Silva.

Contradição

Apesar de a PMDF tratar o afastamento dos comandantes como procedimento rotineiro, em outro caso de suicídio, ocorrido menos de 24 horas após a morte da tenente no Guará II, o superior do sargento que tirou a própria vida permaneceu na função de chefia.

O major Cláudio Peres segue desempenhando as funções de comando da Rondas Ostensivas Táticas Motorizadas (Rotam), onde o policial que se matou era lotado.

Dados sob sigilo

O suicídio de militares e agentes de segurança nas diferentes polícias e instituições das Forças Armadas é tratado como tabu nas corporações. Tanto que não há dados públicos acerca do número de casos no Distrito Federal. Contudo, levantamento feito pelo Grupo de Estudo e Pesquisa em Suicídio e Prevenção da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) ajuda a jogar luzes sobre a questão e a dar uma ideia do tamanho do problema.

Com base nos dados da pesquisa, cuja fonte é a própria Polícia Militar fluminense, de 1995 a 2009, foram registrados 58 casos de suicídio de PMs naquele estado e mais de 36 tentativas.

Conforme análise divulgada em 2016, das 58 mortes por suicídio de policiais militares da ativa, três ocorreram em serviço e 55 durante folgas. Foram, em média, três suicídios a cada ano.

Em São Paulo, segundo a Secretaria de Segurança Pública, 228 agentes suicidaram-se nos últimos 10 anos. Ou seja, uma morte a cada 17 dias. Do total de ocorrências, 182 dizem respeito a militares (79,8%) e 46 a civis (20,2%).

De acordo com o relatório, policiais com os mais altos níveis de estresse ocupacional são aqueles com tempo superior a 15 anos de serviço, sargentos, oficiais exercendo funções administrativas, divorciados, com idade acima de 30 anos, que não desfrutam de lazer em suas horas vagas; e os que não têm hobbies.

Comportamento suicida

Em 2014, um estudo do Ministério da Justiça e da Uerj ajudou a traçar o comportamento suicida entre profissionais da segurança pública. As informações foram trabalhadas considerando o banco de dados da Rede EAD da Secretaria Nacional de Segurança Pública e entrevistas com policiais militares de 27 localidades.

A pesquisa mostrou que, apesar da gravidade do problema, o suicídio policial não recebe a devida atenção do poder público nem das organizações policiais internacionais e nacionais.

Uma das razões da invisibilidade do fenômeno deve-se à cultura hierárquica na polícia. “No Brasil, o descaso do poder público é condizente com o caráter tradicional das políticas de segurança pública no país. No Rio de Janeiro, por décadas, gestores públicos priorizavam investimentos materiais (viaturas, radiocomunicação e armas) em detrimento de políticas de valorização de recursos humanos de policiais civis e militares”, destaca trecho do estudo.

Especialista em formação de mão de obra na área de segurança, o ex-policial Jorge Matos Alencar levanta outra questão. De acordo com ele, ainda existe muita fantasia em torno da profissão: “Muita gente quer ingressar nas Forças por conta do glamour, do status… Pensam que a coisa funciona como nos filmes. E a realidade é bem diferente”.

Para Alencar, é importante que essa realidade fique muito clara ao longo do treinamento. “Infelizmente, muitos soldados, policiais, vigilantes e seguranças vão para as ruas sem estar preparados para enfrentar a violência, ver pessoas morrendo, suportar uma hierarquia forte, muitas vezes injusta”, destaca. Isso, segundo ele, gera frustração e depressão.

 


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